Caros
amigos, companheiros de jornada, usuários de veículos de duas rodas, gente
diversa e versada em discutir sobre como desfrutar da motocicleta, das viagens
e dos relacionamentos em grupo, e de nós que driblamos os problemas da vida,
salve.
Gostaria de começar dizendo o que é mais óbvio: para
explicar o título deste texto, gostaria de dizer que sou um ser humano comum
que gosta de ajudar os outros para ajudar a mim mesmo. Acho que isso define
tudo. Não é necessário lembrar que não sou psicanalista.
Então se alguém tem uma sacola pesada, um trabalho de
faculdade, um lugar longe para ir, se alguém precisar de companhia, de uma
conversa, um ombro ou mesmo uma passagem, fica fácil de resolver.
Mas quando uma pessoa está em conflito, não um
adolescente com crise de identidade, mas alguém adulto e resolvido que criou
expectativas em uma situação e que precisava de certo “feedback” que não foi
percebido, de que forma se deve agir?
Pergunta difícil até para um estudante de sociologia/antropologia
e inquieto observador do comportamento alheio. Ainda mais quando se trata de um
amigo, gente do seu meio sabe? Alguém que claramente te pede ajuda e você se vê
numa situação complexa, tão dura que nesse momento desejei ter formação em psicologia.
E o que isso tem a ver com motociclismo? Bem, talvez
nada. Porém, dentro de alguns círculos, por exemplo, o nosso de motociclistas,
nos tratamos como família, e família nos preocupamos com o bem-estar uns dos
outros, posto que o nosso companheiro de estrada e nós mesmos temos de estar
bem para que a viajem flua e não ocorram acidentes.
Criamos expectativas nas pessoas, isso é um defeito e
quando não somos correspondidos, bate sempre uma decepção. Esperamos que
algumas situações sejam resolvidas a nosso favor, é normal. Acreditamos que
antiguidade é posto, e que o bom trabalho tem de ser valorizado, que os do
contra sempre vão perder. Não estamos prontos para lidar com perdas, não fomos educados
para aceitar a morte, no dia-a-dia queremos sempre nos dar bem. Isso para mim,
como futuro sociólogo, são fatores responsáveis pelo aumento de depressão no
mundo. E para colaborar com minhas idéias, o jornalista que escreveu um livro
sobre depressão intitulado O Demônio do Meio-Dia:
“A depressão é a
imperfeição no amor. Para podermos amar, temos que ser criaturas capazes de se
desesperar ante as perdas, e a depressão é o mecanismo desse desespero. Quando
ela chega, degrada o eu da pessoa e finalmente eclipsa sua capacidade de dar ou
receber afeição.” (Andrew Solomon).
Mas o jeito de ser do brasileiro, sempre se aproveitando da
inocência alheia e fazendo piadas do próprio sofrimento ajuda a encobrir a
depressão quando ela se aproxima.
Se alguém me pergunta o que fazer para ajudar um amigo em
crise eu não saberia responder, mas gostaria muito de ter uma resposta simples,
como por exemplo: “toma aqui a chave da minha moto e vai lá em João Pessoa que
já vai passar sua tristeza”. Mas isso não vale para todos. Talvez só para mim.
Já perdi tanta coisa, meus pais, alguns grandes amigos,
muitas oportunidades, por isso não estou disposto a construir algumas coisas só
para não perdê-las depois. Isso não me torna o cara mais apto a confortar os amigos,
mas sempre que sou solicitado eu tento. Nem sempre consigo, e tento ver isso
como um fato normal, não como mais uma perda, ou já teria perdido a ponte com a
realidade.
Uma das origens dos moto clubes foi o fato de que a
motocicleta pode conferir um pouco de emoção as pessoas que pilotam. Então,
tem-se que os ex-militares, os que voltavam da guerra, procuravam por aventuras
novas em suas vidas e a motocicleta se encaixa bem nesse propósito. Ainda não
consigo provar mas acho que foram eles os primeiros Café Racers, em minha
modesta e incompleta pesquisa.
Então sempre digo a quem está mal da alma para procurar
em algo ou alguém que ficou motivos para continuar sua história. Quem morre,
descansa, eu acredito. E nós que ficamos temos que adoçar nossas vidas com um
pouco de liberdade e de coisas que nos fazem bem. Quem fica é que precisa
continuar vivendo. Continuar ajudando os outros e sendo ajudado a continuar
também. Reciprocamente é melhor, como os abraços e os apertos de mão.
Joel Gomes – acadêmico das
ciências sociais, motociclista, colaborador e próspero do Brokk MC, para o blog
Sem Fronteiras (jotagomes@gmail.com)